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Na imprensa

Tragédia entristece, endurece, mas o que faz o coletivo? Reage, diz psicanalista

By 22 de março de 2021junho 3rd, 2022No Comments

Em entrevista à jornalista Renata Cafardo, do jornal O Estado de S. Paulo (22/03/2021), a psicanalista e professora da Universidade de São Paulo, Maria Cristina Kupfer, fala sobre como lidar com a desesperança no pior momento da pandemia. Ela tem a convicção de que o ser humano tem a capacidade de reagir. “Quando você acha que não tem mais recursos psíquicos para lidar com alguma coisa, você ainda tem muito mais do que pensa”, diz ela, que é uma das pioneiras no Brasil na articulação entre Psicanálise e Educação e autora de livros na área.

Para a especialista, apesar da nova onda da pandemia, adultos e crianças vão se adaptar novamente. “Houve um recrudescimento agora, passado esse sentimento de ‘meu deus, vai começar tudo de novo’, a gente vai ver as respostas de vida. As pessoas, em geral, não se deixam levar pelo mortífero”, diz.  Como exemplo, ela cita professores e escolas que se reinventaram para educar online durante o ano passado. 

Maria Cristina acredita que não se pode responsabilizar a pandemia por todos os problemas que acontecem no Brasil, na educação, na saúde e em outras áreas. “Se olhar com uma certa distância, é um grãozinho, perto de tudo que já acontecia. Achar que a pandemia é a culpada de tudo causa uma cegueira que serve ao reacionário, porque apaga o que tem que ser visto de fato”, afirma. 

Para a psicanalista, a dimensão mortífera pesa mais sobre a cabeça de todos, mas isso é muito dialético, uma vez que junto com a pulsão de morte, está a pulsão de vida. “Quanto mais pesa para as pessoas a dimensão do mortífero, mais existe uma resposta, um movimento de impedir que isso tome conta das nossas vidas. Isso falando da maioria das pessoas, há os que se deixam afetar profundamente e temos as depressões. Mas a tendência geral é responder com mais ânimo e criativamente”, destaca. Um exemplo está nas escolas, no que os professores fizeram, alfabetizando crianças na tela.

Embora o impacto sobre uma minoria seja de sofrimento e de doenças mentais, Maria Cristina acredita que “não se pode dizer que a pandemia provoca um estrago em nível de saúde mental incontornável, irreversível. Não quero dizer que não precisa se preocupar, mas as pessoas acabam encontrando formas de reagir, de fazer viver, fazer aparecer a vida”.

Segundo a psicanalista, a tendência é a gente achar que as pessoas ficam doentes com essas coisas, mas não, é o contrário. “Nós temos instrumentos psíquicos para reagir às tragédias, nós não ficamos doentes assim tão facilmente, ficamos tristes. Aí a tendência é misturar. A tragédia entristece, endurece, mas o que faz o coletivo? Reage. Produzindo formas de reação para não adoecer. As pessoas criam coisas, as pessoas criaram milhares de coisas nos seus 10 metros de apartamento no ano passado. Freud dizia: para não adoecer, as pessoas amam. A ideia é que quando você acha que não tem mais recursos psíquicos para lidar com alguma coisa, você ainda tem muito mais do que pensa que tem. As desgraças vêm e a gente vai se adaptando.”

Para os pais, a situação das crianças em casa traz muitos inconvenientes mas de outro lado, para muitos, foi um momento de se reapropriar de uma função que tinha sido delegada para as escolas. “A tendência contemporânea dos pais é dar muito espaço para a fala das crianças, de colocar as crianças nessa posição de sujeito, o que é muito bom. Mas eles se esquecem que essas crianças ainda estão muito na dependência da fala do adulto. Então, tudo depende da posição do adulto. Se o adulto diz, com firmeza: ‘olha, não tem escola, é assim, estamos num momento em que as coisas mudaram, venha comigo nesse novo movimento, eu seguro sua mão’. Para a criança é muito aliviante, o adulto sabe, vou atrás do adulto. A gente tem a tendência de achar que eles não vão conseguir se controlar, mas vão. As crianças gostam disso, preferem isso, principalmente nos momentos de grande turbulência”. 

Para ler a reportagem na íntegra acesse https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,achar-que-a-pandemia-e-culpada-de-tudo-apaga-o-que-tem-de-ser-visto-de-fato-diz-psicanalista,70003655708

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